Como a bela Pandora
ó Pátria amada
abriste a caixa
urna lacrada
inconsequente e vaidosa
soltastes a peste
a mentira e a raiva
com suas foices em riste
ceifando sonhos e vidas
restando remorsos e tristezas
escombros e pobreza
Este espaço foi criado para expressar opiniões sobre filosofia, cinema, poesia, literatura, fotografia, viagens e outros tantos assuntos que me interessam... eventualmente atualizado. Caso sinta-se estimulado por algum assunto, post ou imagem, comente, participe, ficarei muito satisfeito. Abraços
terça-feira, 30 de outubro de 2018
segunda-feira, 1 de outubro de 2018
Pacífico
Seu
Pacífico, é assim que todos o chamam. Na oficina que ele abre de segunda à
sábado religiosamente as oito horas e fecha por volta das seis da tarde. A não
ser nas tardes de sábado, quando tem uma partida de futebol. Neste caso a oficina
de bicicletas, sua paixão, ou melhor, sua segunda paixão, fecha ao meio dia
para que ele se prepare.
Atende
a todos com gentileza e atenção, principalmente aos moleques. Aos que perguntam
a razão, responde que são seus futuros clientes. É reconhecido na vizinhança
pelo serviço esmerado e alguns clientes vem de outros bairros e até do outro
lado da cidade. Isto enche Seu Pacífico de orgulho. Nas paredes, empoeirados e
amarelados pelo tempo, fotos, pôsteres e flâmulas que relembram as glórias do
passado de seu time do coração. Entre elas um recorte de jornal comemorando os
cinquenta anos do primeiro título estadual salientando ser o primeiro campeão
do estado.
Anexo,
tem uma lojinha onde se pode encontrar peças para as Calois e Monarks, além de
acessórios, como punhos coloridos, selins estofados e pneus especiais. Está
sempre ocupado, serviço não lhe falta.
Ao
chegar em casa, sua mulher começa a desfiar um rosário de queixas que ele ouve
sem se manifestar. Logo vem os filhos com suas demandas. Muitas vezes Pacífico
refugiava-se no banheiro onde demora mais que o necessário para tomar banho ou
fazer a barba. Mesmo assim, logo alguém bate à porta perguntando se vai
demorar. Pacífico esforçava-se para ouvir e tentar atender a todos. Não que as
solicitações da esposa e dos filhos sejam exageradas, mas são muitas e ele, um
só. Não perde a calma, escutava com atenção e promete tentar encontrar uma
solução.
Finalmente
chega o fim de semana e Pacífico mal pode esperar o início da partida. Trajando
a camiseta do seu time do coração, encontra os amigos e fanáticos torcedores, na
frente do estádio uma hora antes início. Trocam informações sobre a escalação,
os reforços e tudo o mais que diz respeito ao amado time enquanto atacam um
churrasquinho ou um pastel.
Entram
ao estádio e dirigem-se ao local que consideram o melhor para assistir à
partida. Pacífico é tomado por uma forte ansiedade que só se dissipa com a
entrada de seu time ao gramado, que é ovacionada como gladiadores ao entrarem
no Circus Maximus. Os árbitros e auxiliares são sonoramente hostilizados mesmo
antes de terem oportunidade de cometer qualquer deslize. O objetivo é a
intimidação causada pela pressão da massa que também é dirigida ao adversário, “Os
que vão morrer, vos saúdam”, ao som dos mantras cantados pela torcida e a
batucada infernal da charanga.
A
tensão em Pacífico já é visível nas mãos cerradas com os dedos brancos e nos
olhos injetados combinando com a cor da camiseta.
Ao
soar o apito inicial a transformação se completa e Pacífico não atende mais
pelo nome. Grita incessantemente palavras que jamais usaria no seu dia-a-dia,
espalhando perdigotos e ofensas para o gramado.
Sua
fúria volta-se até mesmo aos parceiros de torcida que ousam criticar a equipe
em momentos inadequados. Em um lance duvidoso em que o árbitro marca um pênalti
contra seu time, Pacífico perde o fio da sanidade que o liga à normalidade e
tenta invadir o gramado escalando a tela de proteção. É contido pelos Brigadas
que fazem a segurança e levado aos berros e esperneando a uma sala embaixo das
arquibancadas onde fica isolado, sem poder assistir o final da partida e saber
que o goleiro da sua equipe defendeu o pênalti e num contra-ataque o atacante
marcou um gol driblando o goleiro.
Pacífico
tem que se contentar com os relatos dos amigos e as cenas mostradas na TV no
dia seguinte. Somente é liberado de seu castigo uma hora após o término da
partida, já que até os policiais estão indo embora.
Ao
chegar em casa a mulher pergunta por que da demora, gentilmente ele responde
que ficou conversando com os amigos. Cansado e suado percebe um rasgo na
camiseta. Dirige-se ao banheiro e toma um banho demorado. Seu Pacífico sente-se
preparado para enfrentar mais uma semana.
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