quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Tocaia

        Amarrou o tordilho ao travessão sob a sombra de um eucalipto e dirigiu-se a porta do bolicho pelo caminho poeirento. Passou da luz e do mormaço da tarde para a sombra e o frescor do interior, lá divisou o bolicheiro,  as moscas que esvoaçavam e uma figura oitavada na ponta do balcão de prancha.
        Cumprimentou com um "buenas" e foi respondido pelo bolicheiro, a figura no canto do balcão mal balançou a cabeça coberta pelo chapéu.
        Encostou no balcão e nem foi preciso pedir,  o bolicheiro serviu-lhe um liso de canha  para espantar o calor e passou para a sala dos fundos que funcionava como depósito.
        O homem que não usava esporas não perdeu tempo, aproximou-se , colocou a mão no ombro do recém chegado e sacando da adaga, abriu-lhe um novo sorriso encarnado que ia de uma jugular a outra.
        O sangue misturado  à cachaça escorreu encharcando o lenço branco no pescoço do que morria.
        Seus joelhos dobraram, o corpo rolou pelo chão de terra batida que já absorvia o vermelho escuro do sangue venoso.
        Limpou a adaga nas costas do que já não se mexia, colocou-a na bainha e saiu para a luz e o calor da tarde, deixando o corpo e sobre o balcão, as moedas para sua bebida e de sua vítima.


Glossário:
Tordilho - disse do cavalo de pelagem branca;
Bolicheiro - dono da venda, proprietário do estabelecimento;
Liso de canha - dose de cachaça.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

Rebento

O mundo silencia sob a chuva.
Cheiro de terra, perfume de flor,
vida que brota, fruto do amor.