Tânia abriu o guarda-roupa e seus olhos foram atraídos pelo
velho casaco. Todo início da estação fria era a mesma coisa, tirava-o do fundo
do armário e levava à lavanderia.
Mas desta vez era diferente, ao lado dele, exigindo mais
espaço, encontrava-se um casaco novinho, ainda com as etiquetas da loja
penduradas, numa cor mais vistosa e com corte mais moderno. Tânia não podia
perder a oportunidade. O bazar da igreja tinha vindo na hora certa, estavam
recolhendo doações, e ainda poderia ajudar uma pessoa necessitada. Apanhou o
velho casaco, decidida, mas não sem uma
pontinha de apego. Ele lhe servira por muitos anos. Presenciara muitos
acontecimentos em sua vida. Mas não tinha lugar no seu guarda-roupa, estava
ocupando espaço.
Mary saiu para o vento gelado da manhã. Apertou a blusa fina
contra o corpo e correu até o ponto de ônibus em uma tentativa de se esquentar.
Quando o ônibus chegou, estava começando a tremer. Lá dentro estava
confortável. Tirou o livro da bolsa e voltou à página marcada. A heroína iria
receber a notícia da doença do amado.
Quando se deu conta, tinha passado seu ponto, iria chegar
atrasada outra vez.
O próximo ponto ficava em frente a igreja, teria que andar
alguns quarteirões na manhã gelada, pensou. Ao saltar do ônibus, para sua
surpresa, percebe que está acontecendo um bazar de roupas. Seus olhos são
imediatamente atraídos para um casaco usado, mas conservado, que se encontra na
ponta de uma arara. Examina a carteira,
tem alguns trocados, pechincha com a vendedora e sai dali confortavelmente
aquecida pelo " velho" novo casaco. Afinal, perder o ponto não tinha
sido em vão.
Em casa, com mais tempo, examina melhor a peça. Boas
costuras, feito em lã dupla, com forro
de cetim. Puído em um cotovelo e com a marca da alça da bolsa da antiga dona no
ombro esquerdo e um rasgo no forro, mas no geral ainda servia. Tinha se ajustado
perfeitamente, parecia ser feito sob medida, afinal não encontrou etiqueta,
talvez tivesse sido removida.
Era uma garota habilidosa, dois retalhos de camurça nos
cotovelos, uma pequena cerzida, uma boa lavada e o ferro bem quente, ficou como
novo, pelo menos para ela.
Foram juntos a muitos lugares naquele inverno, até a uma peça
de teatro e a um museu, novas experiências.
Quase no final do inverno, enquanto passeava pelo centro da
cidade, olhando algumas vitrines, percebeu que era observada, olhos a seguiam
no meio da multidão como se a reconhecessem
de há muito tempo. Uma antiga colega de escola, uma vizinha...Não, tinha
certeza que não conhecia a moça que a observava.
Tânia afastou-se e embarcou em um táxi que estava no ponto.
Não conhecia a moça, mas apesar das pequenas modificações tinha certeza que era seu velho casaco.
Um sentimento de posse subiu à sua garganta, mas ele
parecia muito bem cuidado pela nova dona,
até parecia mais novo.
Apesar da temperatura confortável no interior do táxi,
apertou mais os braços em torno do corpo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário